sexta-feira, 26 de julho de 2013

Esqueci da seta

Nenhum retorno é definitivo. Nenhuma placa de pare fica no mesmo lugar para sempre. Nem toda conversão é obrigatória e o proibido as vezes se contradiz. O vermelho logo vira verde. E o amarelo, além de atenção, pode significar dinheiro. Cada um é o próprio CET da sua vida. E não da pra sair aplicando multa por aí. Porque uma mão que antes era única, logo vira dupla. E onde era permitido somente parar com o pisca alerta ligado, de uma hora pra outra vira estacionamento exclusivo para idosos. Viver é um ir e vir sem fim. É preciso estar atento aos sinais. Eles nem sempre são visuais. Mas quase sempre são sonoros.

quinta-feira, 25 de julho de 2013

toc toc toc, tem visita pra você.

Para visitar quem você foi, não precisa ir longe. Muito menos virar a página do ontem. É só abrir a porta de casa, passar um café fresquinho e deixar a prosa entrar. Você pode (e deve) aproveitar o silêncio entre um assunto e outro para fechar os olhos e deixar o som de fora colar com o de dentro. E isso acontece tão rapidinho... Para visitar quem você foi, basta uma palavra da infância, um sotaque arrastado, um sorriso de lado e pronto. Lá está você, com os cachinhos balançando nos seus 12 anos. Hum, é tão bom. Já experimentou? Eu me visito constantemente. E o melhor de tudo é que nem preciso fazer as malas. Mas elas sempre voltam cheias de lembranças, pincelando o que eu sou com o que eu era e o que nunca foi embora de mim. Sabe aquela gíria que você não lembrava mais? Aquele sabor que você tinha esquecido? A roupa daquele dia mágico? Está tudo la, te esperando. É só trazer de volta e guardar quentinho dentro da sua gaveta de lembranças. Ontem mesmo eu visitei quem eu era. E trouxe muita saudade, menos idade e um pouco de colo comigo.

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Crianças S.A

Eu tenho uma teoria sobre de onde vêm as crianças. Vou dividí-la com vocês. Enquanto estão sendo formadas na barriga da mãe, elas também passam por uma formação, digamos assim, acadêmica. São 9 meses de um curso intensivo que envolve comportamento, aulas teórias, práticas e experimentais. Isso explica, em parte, porque as crianças são iguais, nao importa se falam português, chinês, árabe ou se ainda nem aprenderam a falar. Antes do nascimento, esta grande prova final que é passar por um túnel escuro e úmido e testar suas cordas vocais num alto e profundo choro, as crianças passam por workshops de birras, intensidade de choro, teimosia, falta de sono e má alimentação. Ah, tem também a matéria “como contestar em público”, que é super procurada por todos eles. Sim, meus caros. É uma grande universidade em que as crianças aprendem, praticam e testam tudo isso antes de repetir aqui, seja lá onde for que ela vá nascer. Pode reparar. Você vai ao restaurante e tem uma criaturinha lá, testando os limites dos pais. Você sai de férias e, no meio do parque de diversão, tem outra fazendo birra e dizendo quase a mesma coisa que a sua diria em qualquer outro parque da sua cidade.Você vai pro Japão e a única diferença entre elas é que quando uma acorda (ou se mantém acordada) a outra já foi dormir ( ou tem a companhia de uma mãe insone tentando fazer com que isso aconteça). Sem falar na fase aprender a andar e a falar. Pode mudar o prazo, mas a sequência é quase a mesma (você que tem mais de um filho vai concordar comigo). É tudo igual. Não importa a língua. Não importa o discurso. O curso é o mesmo. E a duração também. (a não ser para aquelas apressadinhas que abandonam o curso antes de todo mundo). Tô louca ou não é mais ou menos assim que acontece? Só pode ser, gente. Ta na hora de criarem uma universidade assim para os pais.

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Quando a vida desvira a gente

Eram 3 da manha de uma segunda qualquer. Abro o olho e o teto está no chão. Fecho logo em seguida. Abro e estou em uma xícara maluca que gira sem parar. Seria divertido se não fosse de madrugada. Para a vida que eu quero descer. A vida continua e eu desço da cama. Piso no teto e olho o chão por cima. Tem algo errado. Deito e fico quietinha esperando passar. Mas só passou com remédio. Que bom se pra cada problema houvesse um remédio. Mas não há. Levanto da cama e tropeço em fragmentos. Me aproximo deles e vejo palavras. Soltas pelo chão. Caíram de mim enquanto eu estava de cabeça pra baixo. Junto algumas e consigo formar frases. Algumas sem sentido. Mas uma tem todo o sentido do mundo. Me agarro a ela e me desviro do avesso. É isso. Encontrei a saída do labirinto.

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Vício social

Este não é mais um texto sobre o imperativo do momento: o curtir. Mas ele passeia por ai. E também passeia pelo postar, pelo acessar, pelo clicar milhões de vezes até um coraçãozinho a mais aparecer. E em épocas de corações partidos, secos e cinzas, um coração vermelho saltitante faz toda diferença, nenão? Você tira um foto, escreve um texto, uma frase engraçada e já divide ali com todo mundo. Mas nunca o dividir foi tão solitário. Nunca o dividir foi tão esperando o algo em troca. Você posta e pronto. Não vai embora nunca mais. Dá uma espiadinha pra ver se foi aceito. Lê o comentário mas demora um pouquinho para recomentar. É tipo o “não ligar no dia seguinte” só para se fazer de difícil. Mas qual é o tempo ideal? 1 minuto? 15? As redes sociais são tão confortáveis que a gente chega e fica. Só mais um pouquinho, só mais uma olhadinha, só mais uma clicadinha. Ai, mas o papo está tão bom... Hum, mas eu tenho tudo aqui, nem preciso me levantar pra pegar o controle. Sabe como é? Daqui, do meu lugar em frente ao computador, eu controlo tudo. Poucos likes na foto? Hum, deixa eu trocar a de capa pra ver se melhora. Como uma espécie de exame oftalmológico. Assim ficou melhor ou assim? E por ai vai com o post, com a sua opinião, com a sua popularidade. Estamos todos online. Estamos todos nos curtindo loucamente. Nunca tivemos tantos amigos. E nunca estivemos tão viciados uns nos outros. Ou seria em nós mesmos?

segunda-feira, 1 de julho de 2013

O olhar de uma mãe

Você pode comprar milhões de livros antes de ter um filho. Pode frequentar reuniões semanais com outras mães pra ver se absorve o dom por osmose. Pode se sentar num banco de shopping, às 15h da tarde de um domingo, com sua barriga de 7 meses, e fazer um laboratório ao vivo. Pode assistir a entrevistas de pediatras, marcar 18 consultas antes, virar a melhor amiga televisiva da super nanny. Você pode fazer o curso de “como ser mãe” em 4 horas em alguma maternidade por aí ou pesquisar blogs, artigos, tratados sobre o assunto. Mas só pode ser mãe quem tem filho. Porque é ele quem te faz descobrir o manual da mãe que existe em você. E só ele consegue fazer esta tradução simultânea. E veja bem, estou dizendo simultânea e não instantânea. Porque o instinto materno, na minha opinião, não nasce com o filho. Ele é aprendido e assimilado no dia-a-dia. Em cada chorinho sem bula. Em cada pergunta desavisada. Em cada birra, mas também nas gargalhadas sem sentido. No cheirinho que fica no pescoço quando ele acorda. No olhar que vira um só antes de dormir. Ter um filho não é somente ter. É ser. É estar. É compartilhar. Amar, é claro, não preciso nem falar. É educar e se reeducar. Mas isso é assunto demais, me permito deixar para depois. Ter um filho é, antes de mais nada, aprender a ser mãe.