quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Me editando

Quando era criança, não conseguia entender muita coisa.
E me lembro de várias vezes pensar: “Ah, quando eu crescer vou entender. Deve ser porque sou criança ainda.”
Eu não conseguia entender o fato de, por exemplo, na farmácia também vender sorvetes e picolés.
Achava um absurdo sem fim.
Como um lugar que vende remédios para dor de garganta pode também vender sorvetes e picolés? Se um pode ser a causa do outro?
Também não entendi, na minha festa de 10 anos, como o menino que eu era apaixonada pôde dançar a noite toda com uma das minhas melhores amigas.
E chorei por 2 dias achando estranho, mas muito estranho mesmo uma pessoa que você ama tanto te fazer chorar e não sorrir. Como pode?
Também senti essa coisa estranha quando meu irmão saiu da barriga da minha mãe pra morar na minha casa. Era tudo meu. Por que não podia ser mais?
Não entendia o fato do jiló ser tão amargo e mesmo assim fazer bem.
Como entender?
Daí eu cresci.
E adivinha?
Não entendo porque amamentar pode ser tão bom e doer tanto.
Deve ser o mesmo princípio do jiló.
Não entendo ter que gastar dinheiro com uma carteira. Se vou gastar, o que vou colocar lá dentro?
Não entendo ter que sofrer para merecer. Tipo o princípio da promessa, que passei anos da minha vida fazendo.
Assim como não entendo sofrer por amor.
Não entendo tanta coisa que acontece lá fora.
Mas agora estou falando só do que acontece aqui dentro.
Depressão pós-parto. Por que?
Ah, quando eu ficar velha vou entender. Deve ser porque sou nova ainda.





terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

canhotices


Sempre fui de esquerda.
Apesar do mouse na mão direita querer sempre provar o contrário.
Apesar da minha mãe me explicar que a mão direita pra mim era aquela que eu escrevia. Mesmo ela sendo a esquerda, sempre seria a direita. ( se te confundiu, imagina eu com 4 anos ouvindo isso)
Apesar de não conseguir abrir uma lata de leite condensado ou de molho de tomate.
Apesar de borrar todos os dedos que não pegavam na caneta enquanto eu escrevia.
Apesar de demorar a aprender a dar um laço e de me enrolar bastante para saber em qual mão iria o anel de casamento.
Sempre tive um certo orgulho de ser canhota.
Apesar de tudo.
Sempre me veio um sorriso fácil ao descobrir outros canhotos iguais a mim.
Uma espécie de satisfação em ser diferente da grande maioria.
Sinto a mesma coisa com os meus cachos (mas isso é uma outra história).
Amo ser canhota.
Acordar com o pé esquerdo.
Ser um pouco atrapalhada.
Não saber direito como cortar um papel bem retinho.
E ter que pensar bem rápido para não desobedecer o gps.
Amo a surpresa de alguém que me descobre canhota.
O sentar torto nas carteiras da escola.
A letra desengonçada tentando se desenhar na mão que é sempre cúmplice.
E a surpresa de ter um filho seguindo as mesmas linhas tortas e borradas que as minhas.l