sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

Dor de cotovelo

Você chegou em casa com o braço inchado, já meio roxo, reclamando de muita dor.
Disse que tentou chorar mas que a dor era tanta que não conseguiu.
Fomos pro hospital e, no caminho, as curvas acentuavam os seus gemidos.
Fizeram raio x, fizeram brincadeiras e você respondia meio sem graça, só pra ser simpático.
Então veio o doutor e disse que seu cotovelo tinha mesmo quebrado e que seria necessária uma cirurgia.
Nessa hora eu tremi, o choro se equilibrou na pontinha dos meus olhos mas eu lembrei da sua força e me fiz forte também.
Enquanto você perguntava se a gente já ia embora, eu só tremia, filho.
Então foram 13 horas de jejum, braço e respiração engessados. Você só queria saber se não ia sentir mais dor enquanto eu me lembrava de que passei por algo parecido quando tinha quase a sua idade.
Me lembrei do gesso, da dor insuportável ao virar cada esquina e da anestesia pra fazer tudo voltar ao lugar.
Acontece, filho, que o osso até volta, mas a gente nunca. Quebrar algo é calcificar pra sempre essas memórias na gente.
Já no fim do dia você entrou na sala de cirurgia com medo, mas com um sorriso no rosto. Queria que a gente fosse junto, mas entendeu que estaríamos ali quando você voltasse.
Os medicos disseram que você só parou de conversar e contar suas histórias quando a anestesia fez efeito.
Lá fora, a anestesia não pegava de jeito nenhum.
Duas horas depois você voltou.
Sem reclamar, sem chorar, com ainda mais histórias pra contar. Disse que tinha um montão de médicos em sua volta e que todos os seus amigos estavam preocupados com você. “Eu tô muito requisitado, mamãe”.
É que você transforma tudo em amor, meu filho.
Já estamos em casa.
E, cada vez que olho pra você assim, de gesso, revivo um pouco a minha experiência aos 6 anos.
Me lembro do peso, da coceira, da vontade de me movimentar pela vida.
Ter filhos é atualizar a nossa própria infância.
E não tem tipoia que segure todas essas emoções.

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